Depois de uma disputa que atravessou boa parte do século XIX, o Brasil se tornou uma república. Quando tornado uma nação independente (1822), o Brasil já havia objetado o Monarquismo Absolutista, como comprova a própria implantação da Constituição Política do Império do Brasil (1824), à qual o Imperador teria que se submeter. Com a proclamação da República (1889), triunfava finalmente no país os ideais exalados pela Revolução Francesa (1789).
A exemplo do acontecido na Europa, onde o Papa Gregório XVI e Pio IX se colocaram na contramão do republicanismo, a Igreja Católica Romana no Brasil sempre viu com desconfiança os ventos republicanos que transitavam pelo país. Mas por fim, a República veio e com ela a laicização do Estado brasileiro. Por uma parte, a Maçonaria e as ideias liberais, anticlericais, cientificistas, estiveram presentes no interior do movimento republicano e, por isso, não interessava à República a interferência deu uma Igreja considerada obscurantista e anacrônica. Por outro lado, já havia se amplificado a presença protestante no país, através dos anglicanos, metodistas, presbiterianos e batistas, que chegaram ao país via Inglaterra e Estados Unidos. Precisava-se também respeitar e dar espaço à atuação desses grupos, que sofriam perseguição dos católicos, não obstante a concessão realizada pelo artigo 5 do Título 1 da Constituição Política do Império do Brasil (1824), que você pode encontrar no post Quando o Império do Brasil consentiu Igrejas Protestantes. Esses grupos, por sinal, eram mais afeitos à ideia de democracia republicana que os católicos, que estavam historicamente ligados à hierarquia monárquica, inclusive em sua própria constituição institucional.
A República foi proclamada em 19 de novembro de 1889 e já no mês de janeiro de 1890 foi promulgado o Decreto nº 119-A, de 7 de janeiro de 1890, pelo qual se estabelecia a separação entre Igreja e Estado, depois de quase quatrocentos anos de Padroado. É preciso que essa separação não aconteceu de maneira radical e virulenta como temia a Igreja e desejavam as alas republicanas mais radicais, porém sim moderada, graças à presença de personagens como os baianos D. Antônio Macedo Costa e Ruy Barbosa.
Confira abaixo o Decreto nº 119-A:
DECRETO Nº 119-A, DE 7 DE JANEIRO DE 1890.
Prohibe a intervenção da autoridade federal e dos Estados federados em materia religiosa, consagra a plena liberdade de cultos, extingue o padroado e estabelece outras providencias. |
O Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brasil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação,
decreta:
Art. 1º E’ prohibido á autoridade federal, assim como á dos Estados federados, expedir leis, regulamentos, ou actos administrativos, estabelecendo alguma religião, ou vedando-a, e crear differenças entre os habitantes do paiz, ou nos serviços sustentados á custa do orçamento, por motivo de crenças, ou opiniões philosophicas ou religiosas.
Art. 2º a todas as confissões religiosas pertence por igual a faculdade de exercerem o seu culto, regerem-se segundo a sua fé e não serem contrariadas nos actos particulares ou publicos, que interessem o exercicio deste decreto.
Art. 3º A liberdade aqui instituida abrange não só os individuos nos actos individuaes, sinão tabem as igrejas, associações e institutos em que se acharem agremiados; cabendo a todos o pleno direito de se constituirem e viverem collectivamente, segundo o seu credo e a sua disciplina, sem intervenção do poder publico.
Art. 4º Fica extincto o padroado com todas as suas instituições, recursos e prerogativas.
Art. 5º A todas as igrejas e confissões religiosas se reconhece a personalidade juridica, para adquirirem bens e os administrarem, sob os limites postos pelas leis concernentes á propriedade de mão-morta, mantendo-se a cada uma o dominio de seus haveres actuaes, bem como dos seus edificios de culto.
Art. 6º O Governo Federal continúa a prover á congrua, sustentação dos actuaes serventuarios do culto catholico e subvencionará por anno as cadeiras dos seminarios; ficando livre a cada Estado o arbitrio de manter os futuros ministros desse ou de outro culto, sem contravenção do disposto nos artigos antecedentes.
Art. 7º Revogam-se as disposições em contrario.
Sala das sessões do Governo Provisorio, 7 de janeiro de 1890, 2° da Republica.
Manoel Deodoro da Fonseca.
Aristides da Silveira Lobo.
Ruy Barbosa.
Benjamin Constant Botelho de Magalhães.
Eduardo Wandenkolk. – M. Ferraz de Campos Salles.
Demetrio Nunes Ribeiro.
Q. Bocayuva.
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